No episódio 51 do podcast do Renzo, ele discutiu sobre a relação entre justiça e modelo de negócios. 

Eis o contexto: ele esbarrou com um tweet que questionava um modelo de negócio onde a promessa era transformar a pessoa em um desenvolvedor fullstack. Em contrapartida, quando esta pessoa conseguisse um emprego, um percentual do salário seria destinado a empresa formadora.

A resposta do Renzo focou em um ponto essencial: consensualidade entre as partes envolvidas. Na opinião dele (e na minha também), somente as partes envolvidas possuem credibilidade suficiente para opinar sobre o assunto, pois são elas que estão com a pele em jogo

Pois esse é o assunto de hoje: o termo “skin in the game”, que, em bom português seria o “colocar o seu cú na reta”. O termo que vem se popularizando cada vez mais e sendo tão pouco praticado. 

Será que estamos colocando nossa pele em jogo?

O dono da frase

Você conhece Nassim Taleb? Fiz uma breve introdução a um dos filósofos contemporâneos mais importantes no post em que falei sobre a palestra do Augusto na Python Sudeste de 2018. Caso você não tenha lido este post, eu vou refrescar sua memória.

Taleb é um filósofo e estatístico libanês que se erradicou nos EUA fugido de uma guerra. Ele fez fortuna, basicamente, nos momentos de grandes crises financeiras. Como? explorando a aleatoriedade do mundo.

A partir destas experiências, passou também a dedicar parte da sua vida ao estudo do assunto. Foi então que nasceram seus aclamados livros: “Fooled by Randomness”, “The Black Swan”, “Antifragile” e “Skin in the Game”.

Destes, já pude ler a tradução de “The Black Swan” e “Antifragile”. Ambos mudaram minha vida. O próximo da lista, que pretendo ler ainda este ano, é a obra homônima ao assunto de deste post (inclusive prometo um novo post depois da leitura).

Você é uma pessoa frágil?

A obra de Taleb é magnífica, porém extensa e, principalmente, densa. São muitos conceitos, grande parte contra intuitivos, que precisam ser esclarecidos para que suas teorias e modo de pensar e viver consigam ser entendidos.

Um de seus princípios é o fato de que o ser humano é incapaz de fazer previsões de forma eficiente. O problema é que o ser humano continua, inclusive cada vez mais, tentando prever tudo e, com base nessas previsões erradas, outros humanos tomam grande parte de suas decisões. A fortuna de Taleb vem justamente da sua capacidade de enxergar os furos nessas previsões e apostar contra elas, através do mercado financeiro de opções.

A magia do pensamento de Taleb vem do fato dele conseguir trazer essa visão para o dia a dia do ser humano comum. Com isso, ele define três tipos de “estados” de um posicionamento: os frágeis, os robustos e os antifrágeis. 

Uma pessoa frágil é uma pessoa exposta a riscos que, caso se concretizem, devastarão sua condição.  Uma pessoa robusta é uma pessoa menos exposta a estes riscos, e, caso eles se concretizem, esta pessoa conseguirá suportar os danos, mas saindo mais fraco do que entrou.

O ideal, para Taleb, é se posicionar como uma pessoa antifrágil, ou seja, uma pessoa que esteja exposta positivamente a riscos. Caso os riscos não se concretizem, você segue firme e forte. Já caso eles se concretizem, ao invés de sofrer, você irá se beneficiar.

Ou seja, ser uma pessoa antifrágil é ser uma pessoa que se beneficia tanto da ordem quanto do caos.

A Hidra de Lerna é um monstro da mitologia grega que ilustra perfeitamente um exemplo de antifragilidade. Sempre que, em uma batalha, o monstro tinha uma de suas cabeças cortadas, no lugar nasciam duas. Ela deliberadamente se beneficiava do revés.

Ok… este exemplo é fictício. Quer um exemplo da vida real? O próprio Taleb.

Ainda criança foi obrigado a conviver em um ambiente de extrema incerteza pois precisou fugir, junto com seus pais, de uma guerra civil em sua cidade natal. Ele aprendeu a viver – ou melhor, ele se forjou – em um ambiente caótico. 

Anos depois ele fez fortuna se expondo ao risco de forma inteligente e fazendo fortuna na crise financeira de 1987, onde ele apostou contra o mercado. Ele se beneficiou de um ambiente caótico e fez a vida. Segundo o próprio: “não ganhei dinheiro para viver como um rei (…) mas foi o suficiente para eu dizer “foda-se” sem temer sofrer maiores consequências.”

Tá, e eu com isso?

Eu fiz toda essa introdução sobre Taleb e seus pensamentos pois sua filosofia está justamente embasada no fato de que o ser humano não sabe fazer previsões

E por que o ser humano não consegue prever? Uma previsão nunca considera todos os cenários possíveis, já que é impossível prever todos os cenários. Alguém aqui previu o surgimento do coronavírus? Sim… um cisne negro pode aparecer. E segundo a Lei de Murphy, ele VAI aparecer.

O grande problema é que a humanidade vem sendo cada vez mais governada e liderada por uma elite intelectual, política, econômica e cultural que tomam decisões “em nome do povo” baseando-se nessas previsões. 

Mas, você deve estar se perguntando: se a história mostra que não sabemos prever, porque essas pessoas ainda tomam decisões embasadas em previsões? Simples: via de regra essas pessoas não sofrem as consequências de uma má decisão. 

Quer exemplos práticos? Você conhece algum grande político que matricula o seu filho em uma escola pública? Ou que, no auge de uma crise de pedras nos rins, vai correndo para o SUS? Não, né?

Pois é… São esses mesmos políticos os responsáveis por tomar decisões referentes à educação e saúde pública. O discurso deles é lindo, sempre dirão agir “em nome do povo”, mas, na prática, eles estão cagando e andando, já que não sofrerão alguma consequência das decisões que tomarem.

E aqueles artistas que se consideram importantes somente por serem famosos? Possuem soluções prontas para a pobreza dos morros do Rio de Janeiro, todas elaboradas de seu belo apartamento com vista para a praia do Leblon. Ou então defendem a legitimidade da “democracia venezuelana”, curtindo suas férias lá das Maldivas.

Caso as ideias defendidas por pessoas sejam postas em práticas, elas sofrerão alguma consequência? Provavelmente não.

Por que ter “skin in the game”?

Já ouviu aquele ditado que “falar, até papagaio fala”? Você pode contar a história que quiser. Sempre é possível criar um motivo para o sucesso ou uma desculpa para o fracasso.  Mas uma coisa é certa: o que prova que você é realmente bom no que faz são seus resultados. 

E a forma mais certeira de se conseguir bons resultados e atingir o sucesso é colocando sua própria pele em risco. Por quê? Porque se o seu estiver na reta, você não tem outra alternativa a não ser prosperar. Caso você fracasse, você sofrerá diretamente as consequências do seu fracasso.

Isso te faz ser uma pessoa íntegra, de verdade, que, de fato, vive aquilo que diz.

Indo de encontro a isso, vale ressaltar também que “críticas construtivas” de quem não chegou onde você chegar não valem nada. 

O famoso ditado “se conselho fosse bom não se dava, se vendia” existe por um motivo: um conselho geralmente ignora as circunstâncias e as consequências, já que quem fala não vai ,de fato, aplicar aquilo na prática.

Você ouviria conselhos sobre “como ter um casamento feliz” do Fábio Jr? Ou então, como empreender no Brasil, do Eike Batista?

Por isso recomendo fortemente você ouvir conselhos somente de pessoas que passaram pelo o que você está passando.

Viver uma uma vida colocando sua pele em risco é viver uma vida embasada na verdade.  Na credibilidade. É somente isso que se sustenta no longo prazo.